Laranjeiras de Sevilha

As laranjeiras das ruas de Sevilha

As laranjeiras das ruas de Sevilha

Chegamos em Sevilha no início de fevereiro, mês de inverno. Estávamos animados para passar uma temporada em um dos lugares mais quentes e ensolarados da Espanha. A cidade possui milênios de história e se apresenta com uma arquitetura única. Mas o mais me chamou a atenção, na verdade, foram as laranjeiras que adornam as ruas da cidade.

As árvores, em geral são altas e estavam repletas de grandes frutos de cores vivas. O contraste das cores das laranjas, suas folhas verdes escuras e seus frutos alaranjados tão vistosos, com as antigas construções nos deixou encantados. Ao entardecer, então, ganham um tom dourado, reforçando os tons da “Golden hour”.

E obviamente, não se trata apenas de uma experiência visual, já que algumas delas caem e exalam um delicioso perfume cítrico. Mas não se deixe levar por tantos estímulos e cair na tentação de prova-las: trata-se de laranjas amargas!

Felipe e eu temos uma regra para quando viajamos para países aos quais não estamos totalmente habituados com algo da cultura: siga os nativos! Isso ajuda um bocado a não cair em certas ciladas. Mas nem sempre triunfamos! Em uma viagem por Mérida, apesar de observar que ninguém colhia os cítricos das árvores que decoravam o centro, nos deixamos levar e levamos uma laranja para o hotel. O sabor era bastante azedo e obviamente, não serviam para o consumo!

Já em Sevilha, apenas observávamos os ousados forasteiros que queriam comprovar (por si mesmos) o amargor das frutas, apesar de todas as advertências.  Afinal, toda experiência não prejudicial é bem vinda, não é mesmo?

Mas afinal, qual a história desse icônico elemento sevilhano? Siga lendo que já os conto!

 

Por que há tantas laranjeiras em Sevilha?

Primeiramente, cabe saber que são cerca de 60 mil pés de laranja espalhados pelas ruas, pátios e jardins da cidade de Sevilha. E não é apenas seus frutos que encantam. Na primavera, as árvores começam a florir, preenchendo as ruas com o perfume de azahar.

Aparentemente, a razão da presença das laranjeiras relaciona-se com a mitologia grega. Segundo a lenda, Hércules, filho de Zeus, foi o fundador de Sevilha e passava muito tempo na cidade, onde cumpria os doze trabalhos encomendados por  seu primo Euristeu. Após roubar o gado de Gerião e Eritéia, em Cádiz, Hércules teria que ir até a África, roubar as Maçãs de Ouro da imortalidade, que nasciam no Jardim Hespérides. Após conseguir a Maçã de Ouro, associada à laranja, a última missão seria capturar Cérbero. Assim, antes de finalizar seus 12 trabalhos, Hércules descansou, com o fruto da imortalidade, em Sevilha.

Contudo, o que se sabe realmente é que a laranja amarga é procedente da Ásia. Os mercadores genoveses foram os responsáveis por introduzir o produto na Europa. Na Ásia, a laranjeira era relacionada à felicidade de seu dono. E por isso, os árabes, que ocupavam regiões da atual Espanha por volta do século VIII, passaram a cultivar-las, de maneira ornamental, sobretudo, nos territórios do sul.

 

A planta da felicidade

A crença de que a planta traria felicidade aos donos, só fez crescer o seu cultivo nos jardins da cidade e pátios das casas. Aliás, foi a planta da moda na Idade Média. Já no século XII, as plantas foram parar nas ruas. Na mesma época, os árabes construíram um pátio na principal mesquita da cidade, dedicado à planta da felicidade. Anos mais tarde, os cristãos transformaram a mesquita na atual Catedral de Sevilha. Mas o Pátio das Laranjeiras ainda está lá, aberto aos visitantes.

No ano de 1929, Sevilha recebia a grande feira internacional Iberoamericana, e foi quando a laranja amarga se consolidou como símbolo da cidade. Assim, na década de 70, a cidade contava com apenas 5 mil pés de laranja na cidade. Para a nossa sorte e vislumbre, esse número cresceu e as laranjeiras podem ser vistas em diversas partes da cidade. Garantindo, inclusive, sombra nos dias escaldantes da cálida Sevilha.

 

Ruas de Sevilha
Pelas ruas de Sevilha

 

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As Flores de Azahar

Faço então, um adendo, explicando o nome que se dá às flores de laranjeiras: azahar. O termo vem do árabe “az-zahr” e significa algo como azar ou sorte.

Mas o azahar não é, exclusivamente, a flor da laranja amarga. Antes de tudo, refere-se à flor do limão, que nós conhecemos por “limão siciliano”. O que acontece é que o aroma das flores das laranjeiras da variedade amarga possuem aroma muito semelhante à do limão.

E cabe aqui dizer, que além do princípio de felicidade, naquela época também se cultivava as laranjeiras pelas propriedades medicinais de suas flores.  Era comum produzir essências e óleos a partir do azharar, utilizados para diversos fins curativos.

Também, por seu aroma bastante apreciado, passou a ser utilizado como essência para perfumes. Os árabes desejavam tornar Sevilha, a capital mundial dos perfumes.

Laranjeira-Sevilla
Início da floração das laranjeiras

 

A utilização das laranjas ao longo da História

No passado, as flores, folhas e laranjas tinham sua função medicinal, aromática e culinária. Enquanto as folhas e flores eram utilizadas para a produção de óleos curativos ou de perfumaria, comumente dispostos nos banhos árabes, a fruta incrementava o cozimento de carnes de caça e compotas.

Conta-se ainda que na idade média, as laranjeiras, seja na época da floração como na frutífera, ajudava a mascarar os maus odores das ruas e também das pessoas, que tomavam banho apenas duas vezes ao ano por conta de certos preceitos cristãos.

Na atualidade, do total, 50 mil laranjeiras pertencem ao município de Sevilha, o que representa 25% das árvores do centro urbano. Elas produzem cerca de 6 toneladas de frutos e são destinadas a diversos setores da indústria e aproveitadas em sua totalidade. Entre os meses de dezembro e março, trabalhadores da prefeitura da cidade são responsáveis pela coleta e destino das laranjas. A coleta é realizada à mão, em função da localização das árvores, em ambiente urbano, com carros estacionados, trânsito de pessoas e ruas estreitas.

A atividade industrial da cidade gira em torno da laranja. Portanto, o produto não vem apenas das laranjeiras do centro urbano, mas também, dos produtores dos arredores da cidade.

Laranjeiras de Sevilha

 

As laranjas amargas de Sevilha e a Família Real britânica

Inicialmente, como comentei, se utilizava as flores com fins medicinais e de perfumaria. Já no século XVIII, floresciam as campanhas navais escocesas e inglesas. Estes, descobriram que levar os cítricos que levavam, evitava o escorbuto, uma enfermidade bastante comum entre os marinheiros. O escorbuto provocava intenso sofrimento e era letal. Mas a maneira que encontraram para conservar as frutas, para que resistissem durante as longas viagens, era fermentando-as ou macerando-as com açúcar. Esse processo foi o que provavelmente originou a tradicional marmelada de laranja amarga, especialmente apreciada pela Rainha Elizabeth II.

Aliás, as laranjas amargas da capital andaluz fizeram sua fama na Inglaterra, e inclusive, no palácio real. No século XIX, a produção de laranjas de Sevilha destinava-se, sobretudo, para a produção da marmelada. As marmeladas que chegavam à mesa da Família Real britânica procediam dos jardins do Real Alcázar de Sevilha. A esta altura, também se produzia bebidas, licores e cremes com as laranjas.

 

A poluição de Sevilha

Porém, infelizmente a poluição da cidade de Sevilha impede que, na atualidade, se utilize os exemplares colhidos na zona urbana, para fins alimentícios. A boa notícia é que este tipo de árvore auxilia no combate à poluição, já que são grandes captadoras de dióxido de carbono.

Assim, nos dias de hoje, uma parte das laranjas colhidas vão para destilarias, para a fabricação de óleos essenciais e fragrâncias. Uma outra parte serve para a produção de ração destinada ao gado e caprinos. Há ainda, uma parcela que seria considerado resíduos, mas que tem sido utilizados na produção de biogás. A prefeitura ainda exige que uma parte seja destinada à compostagem, mas acaba sendo a menor parte da produção.

 

Leia também: Conheça Mérida e o Passado Romano da Espanha

 

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Espero ter te despertado o desejo de passear pelas ruas de Sevilha e admirar a beleza das laranjeiras! Como vamos passar uma temporada na cidade, aguarde que muitos outros posts virão!

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Um abraço e até breve!

6 comentários em “As laranjeiras das ruas de Sevilha”

  1. Sônia Aparecida de Sena Fernandes

    Parabéns, Nazeli.

    É um orgulho imenso saber que uma galiense e ex-aluna da escola Graciema escreve tão bem e com sensibilidade.

    Amei o seu texto!

    1. Obrigada, Sônia! É muito importante receber esse Feedback! Nos dá ânimo para seguir e a certeza de que estamos no caminho certo! Aprendi muito ao longo das minhas vivências e estudos, mas certamente a base veio dali e dos excelentes professores que tive no Graciema e sou muito grata por eles! Um beijo!

    1. Muito obrigado pela mensagem. Esse carinho nos motiva a continuar com o nosso projeto.
      Sevilha é uma cidade encantadora. Cada esquina, cada detalhe, cada pátio árabe escondido revela surpresas maravilhosas… Super recomendamos!

  2. Oi vendo agora este post…teria alguma receita com esta laranja ?
    Tenho ela plantada em casa e está dando frutos…gostaria de saber se tem alguma técnica especial pra usar com ela.

    1. Olá!
      Infelizmente, ficarei devendo as receitas. Mas sugiro você buscar por receitas, em castelhano, já que elas são mais comuns na Espanha, salvo engano, México, e certamente, você encontrará algo de marmeladas, compotas e licores, ou quem sabe até, extrato. Um grande abraço!

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